sábado, março 16, 2024

nicole sealey

 a violence
 
You hear the high-pitched yowls of strays
fighting for scraps tossed from a kitchen window.
They sound like children you might have had.
Had you wanted children. Had you a maternal bone,
you would wrench it from your belly and fling it
from your fire escape. As if it were the stubborn
shard now lodged in your wrist. No, you would hide it.
Yes, you would hide it inside a barren nesting doll
you’ve had since you were a child. Its smile
reminds you of your father, who does not smile.
Nor does he believe you are his. “You look just like
your mother,” he says, “who looks just like a fire
of suspicious origin.” A body, I’ve read, can sustain
its own sick burning, its own hell, for hours.
It’s the mind. It’s the mind that cannot.
 
 

 
uma violência
 
Ouves o uivo dos rafeiros perdidos
lutando por restos atirados da janela de uma cozinha.
Parecem as crianças que podias ter tido.
Se tivesses querido filhos. Se tivesses um osso maternal,
tê-lo-ias arrancado do teu ventre e atirado 
pela escada de incêndio. Como se fosse o obstinado
fragmento embutido no teu pulso. Não, tu escondê-lo-ias.
Sim, escondê-lo-ias dentro da matrioska vazia
que tiveste desde menina. O seu sorriso
lembra-te o teu pai, que não sorri.
Nem tampouco acredita que és dele. "És igual
à tua mãe", diz ele, "a tua mãe, que é igual a um fogo
de origem suspeita". Um corpo, li, pode suportar
a sua própria doença, o seu próprio inferno, durante horas.
É a mente, é a mente que não pode.