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quinta-feira, junho 20, 2024

anna cristóbal lecina



la vergüenza se esparce por las arterias de un pueblo sin memoria
menguar en los caminos de tierra que ladean sus granjas
con vacas y cerdos como ofrendas
es ver palidecer los rizos de la niña que fuimos
las picaduras de abejas
la sangre de unas rodillas peladas
en las manos diligentes de nuestras madres y abuelas
 
ya nos vamos alejando de la oscuridad de los corrales
de los ojos opacos de los terneros
los campos de maíz runrunean secretos
y de la tierra empapada por los aspersores convulsionan
las fisuras de los hombres que durante el día siegan su dolor
entre arado inyecciones y semillas
 
más tarde llegamos a casa y los purines se cuelan
en cada una de las habitaciones donde hacemos el amor
caladas por la humedad de la carne extrañamos el silencio
[envuelto en la asfixia seca del lodazal
el asfalto radioactivo tal vez
hablar solas en notas de voz
cuando no hay nadie en la ciudad a quien abrazar
recurrir a amantes pretéritas
para reconocernos en un espejo de cicatrices
en un desierto de autopistas que tenemos que cruzar
(124 son concretamente los km que separan mi soledad
de tu casa en el río)
para volver a encontrarnos cada vez y reescribir la historia
hecha de orquídeas esqueléticas buscando sus pétalos boca abajo
 
(¿pero realmente hay una historia que vivir?
¿realmente contamos con tiempo de descuento
para ungir en las membranas
la oración obcecada del amor devuelto a la tierra?)
 
tras las mosquiteras simplemente somos extremidades afásicas
con memoria deshilvanada
corrientes de heridas esparcidas como líquenes
 
fíjate: no te sorprende que la gata lleve arrastrando su celo toda
[la semana en la gravilla
ha dejado de entristecerte el cacareo de las codornices en la huerta
[de al lado
 
si algo está claro es que no tenemos más palabras
para circular en el relato
 
no tenemos más palabras
 
apaga la luz corre las cortinas
que la crueldad del sol en la mañana
no sofoque lo que queda de nuestra resistencia
 
ya no tenemos más palabras
 
 
 
 
 
a vergonha alastra-se pelas artérias de um povo sem memória
minguar nos caminhos de terra que ladeiam os seus minifúndios
com vacas e porcos como oferendas
é ver empalidecer as tranças da menina que fomos
as picadas de abelhas
o sangue de uns joelhos descascados
nas mãos diligentes da nossas mães e avós
 
já nos vamos afastando do escuro dos currais
dos olhos opacos dos vitelos
os campos de milho ronronam segredos
e da terra empapada pelos aspersores convulsionam
as fissuras dos homens que durante o dia ceifam a sua dor
entre arado injeções e sementes
 
mais tarde chegamos em casa e os fertilizantes empastam-se
em cada uma dos quartos onde fazemos amor
caladas pela humidade da carne estranhamos o silêncio
[envolto na asfixia seca do lamaçal
o asfalto radioativo talvez
falar sozinhas em mensagens de voz
quando não há ninguém na cidade a quem abraçar
recorrer a amantes pretéritas
para nos reconhecermos num espelho de cicatrizes
num deserto de autoestradas que temos de atravessar
(124 são concretamente os km que separam a minha solidão
da tua casa no rio)
e reescrever a história
feita de orquídeas esqueléticas procurando as suas pétalas viradas para baixo
 
 
(mas há realmente uma história para viver?
contamos realmente com tempo de desconto
para ungir nas membranas
a oração obcecada do amor devolvido à terra? )
 
a seguir às mosquiteiras, somos apenas extremidades afásicas
com memória descosida
correntes de feridas espalhadas como líquenes
 
repara: não ficas surpreendida pela gata que arrasta o seu zelo toda
[a semana no cascalho
deixou de te entristecer o cacarejo das codornizes na horta
[do lado
 
se algo está claro é que não temos mais palavras
para pôr em circulação no relato
 
não temos mais palavras
 
apaga a luz corre as cortinas
que a crueldade do sol na manhã
não sufoque o que resta da nossa resistência
 
já não temos mais palavras