domingo, outubro 13, 2024

clara monzó


ARTISTA RETIRADO
(SHINGEKT NO KIOJIN)
 
Qué pintaría David Hockney
si estuviese sentado en mi terraza,
atrás el ruido del tranvía,
restos de arena en los zapatos.
 
Mi madre cruza la piscina
desnuda y a zancadas,
igual que el titán hembra,
con la columna de lagarto
al sol, como un estegosaurio,
con la columna de Vanessa Redgrave
en esa escena de Blow Up.
 
No quedan vasos limpios;
no queda nada por usar.
 
Cómo estaría con los grillos y cigarras,
envuelto en quejumbrosas cremalleras;
qué hará al caer la noche David Hockney,
una vez solo, el toldo recogido,
repasando recuerdos heredados.
 
 

 
 
ARTISTA APOSENTADO
(Ataque dos Titãs)
 
Que pintaria David Hockney
se estivesse sentado na minha esplanada,
atrás o barulho do elétrico,
restos de areia nos sapatos.
 
A minha mãe atravessa a piscina
nua e com passos largos,
igual à titã fémea,
com a coluna de lagarto
ao sol, como um estegossauro,
com a coluna de Vanessa Redgrave
naquela cena do Blow Up.
 
Não ficam copos limpos;
não fica nada por usar.
 
Como estaria com grilos e cigarras,
envolto em zíperes choramingas;
o que fará ao cair da noite David Hockney,
uma vez só, o toldo recolhido,
repassando lembranças herdadas.
 

sábado, outubro 12, 2024

goliarda sapienza

 
Pioggia d’odio dal cielo
cade sui prati e secca
l’erba le mani arde i capelli acceca
l’uomo che attento alto fissava quel
volo d’ali.
 
Grandina odio sui tetti
scardina i muri
sega i tendini in corsa del cavallo
che stramazza fumante sul selciato.
 
 

 
 
Chuva de ódio do céu
cai sobre os prados e estiola
a relva as mãos queima o cabelo e cega
o homem que no alto com cuidado fixava esse
voo de asas.
 
Saraivada de ódio sobre os telhados
desmantela paredes
ceifa os tendões no galope do cavalo
que se estatela fumegante no chão.
 

sexta-feira, outubro 11, 2024

alejandra arreola


me está robando
y me hace feliz
los necios insisten
¿cómo quieren que nombremos su arte?
¿robo en voz alta, robo a capela, robo híbrido,
robo lectura o libre robo?
acordamos pocas cosas
acordamos que
no usamos
pegamento ni solvente
 
 

 
 
está-me a roubar
e torna-me feliz
os néscios insistem
como querem que nomeemos a sua arte?
roubo alto, roubo à capela, roubo híbrido,
roubo de leitura ou livre roubo?
concordamos em poucas coisas
concordamos que
não usamos
cola nem solvente

quinta-feira, outubro 10, 2024

greta garcía


—Tienes que relajar el recto, Pili, estás muy tensa, respira, esto va a salir sin problema.
 
Me ha llamao Pili. Esto se está poniendo personal. Y se ha puesto guantes de látex y un kilo lubricante. Mae mía, esas manos entran donde quieren. Si me leyera el pensamiento. Si supiera. No. No quiero. Ahora mismo no quiero que me lea, se va a creer que además de cepillarme los dientes de un modo raro soy una depravá. Aunque no sé qué tiene de malo reconocerlo, soy guarra, estoy cachonda, ¿y qué pasa? ¿Se dará cuenta de que me chorrea el perineo? Perineo, me encanta la palabra y me encanta el sitio. Se me quedó grabá cuando me diagnosticaron el papiloma viru y la cándida y algo más que ya no me acuerdo, que me dio to junto. Es vergonzoso que hasta que no me lo dijo el ginecólogo yo no me había mirao el perineo con un espejo, ni me sabía la palabra. ¡Y el perineo lo es todo! Sin perineo se cae to pa abajo. Una encoge el perineo y ya se mete el bajo vientre y tiene bien colocaíta la pelvis, y con la pelvis en su sitio y el coxis pa dentro se abre el diafragma y ya está una perfectamente colocá pa bailar fregar pasear comer o simplemente esperar a que pase algo. Pero qué vergüenza más horrorosa, que con lo flexible que soy podría haberlo analizao en cualquier momento. Yo, tan cristiana apostólica románica mongólica, ¿cómo me iba a mirar mi propio coño? Otros sí, pero ¿yo? ¿Cómo iba a hacer yo eso? Fatá. Es mu triste que hasta los dieciséis el perineo no tenía cara pa mí. La mierda de estas cosas es que te las puede pegar una persona y que no te salga el regalito hasta que te dé la bajona y ya no sabes quién te lo ha pegao y no le puedes dar las gracias, es un amigo invisible. Así, cuando tus defensas se van de vacaciones, el perineo dice: ¿Qué pasa, tía? Yo tenía verrugas y hongos con aspecto coral, presioso, remataban hasta mis labios interiores y exteriores con nuevos volúmenes y texturas que me tenían horas fasciná con el espejo en mano, mi coño era una puerta a otra dimensión. Aunque me alegré de no tener tantos picores me dio pena aniquilar mi nuevo adorno. Es injusto acabar con la vida de unos pocos hongos y virus cuando dejamos que sus hermanas bacterias correteen por nuestro cuerpo en libertá. A veces me visualizo así, como una bacteria enorme que simplemente ocupa espacio, como una ameba pesá que no aporta absolutamente nada. Cuando una asume lo que es, que no es más que una masa de microorganismos, pierde la noción de responsabilidá, de culpa, y le entra la risa floja. Antes puede ser que se deprima, como cuando el ginecólogo asomó entre mis piernas y apoyando su mano fría en mi rodilla afilá me dijo: Tieneh papiloma viruh. El hijo puta me pilló totalmente desprevenía. El ginecólogo y mi coño tienen el mismo pelo marrón rizaíto, y cuando asomaba entre mis piernas me imaginaba que a mi coño le salía una cara como la suya en chiquitito y que conversaban como dos perros de agua:
 
—Wuf wuf.
—Wuuff.
 
 

 
 
 Tens de relaxar o reto, Pili, estás muito tensa, respira, isso vai sair sem problema.
 
Chamou-me Pili. Isso está a ficar pessoal. E calçou luvas de látex e um quilo de lubrificante. Mãe minha, essas mãos entram onde querem. Se me lesse o pensamento. Se soubesse. Não. Não quero. Agora não quero que me leia, vai julgar que além de escovar os dentes de um modo estranho, sou uma depravada. Embora eu não saiba o que há de errado em reconhecer isso, sou uma vadia, estou excitada, e o que acontece? Dará conta que o meu períneo está a escorrer? Períneo, encanta-me a palavra e encanta-me o sítio. Ficou-me gravado quando me diagnosticaram o papiloma vírus e a cândida e algo mais que já não me lembro, que me deu tudo junto. É vergonhoso que até o ginecologista ter-mo dito, eu não tinha olhado para o meu períneo com um espelho, nem sabia a palavra. E o períneo é tudo! Sem períneo cai tudo para baixo. Uma tipa encolhe o períneo e já se mete o baixo ventre e tem bem posicionada a pélvis, e com a pélvis no seu sítio e o cóccix para dentro, abre-se o diafragma e já está perfeitamente colocadinha para dançar esfregar passear comer ou simplesmente esperar que algo aconteça. Mas que vergonha mais horrível, que com a flexibilidade que tenho poderia tê-lo analisado em qualquer momento. Eu, tão cristã apostólica românica mongólica, como ia olhar para a minha própria boceta? Outros sim, mas eu? Como eu faria isso? Fatal. É muito triste que até aos 16 anos o períneo não tinha rosto para mim. A merda destas coisas é que podem ser pegadas por uma pessoa e não sair a prendinha até te dar a filoxera e já não sabes quem ta pegou e não lhe podes agradecer, é um amigo invisível. Então, quando as tuas defesas vão de férias, o períneo diz : Que se passa, miúda? Eu tinha verrugas e fungos com aspeto coral, lindo, terminavam até aos meus lábios interiores e exteriores com novos volumes e texturas que me deixavam horas fascinada com o espelho na mão, a minha cona era uma porta para outra dimensão. Embora me tenha alegrado por não ter tantas coceiras, deu-me pena aniquilar o meu adorno. É injusto acabar com a vida de uns tantos fungos e vírus quando deixamos que as suas irmãs bactérias andem a correr pelo nosso corpo em liberdade. Às vezes visualizo-me assim, como uma bactéria enorme que simplesmente ocupa espaço, como uma ameba pesada que não acrescenta absolutamente nada. Quando uma pessoa assume o que é, que não é mais do que uma massa de microrganismos, perde a noção de responsabilidade, de culpa, e entra no riso frouxo.Antes pode ser que se deprima, como quando o ginecologista assomou entre as minhas pernas e apoiando a sua mão fria no meu joelho disse-me afiado : Tem papiloma vírus. O filho da puta apanhou-me totalmente desprevenida. O ginecologista e a minha cona têm o mesmo cabelo castanho encaracolado, e quando eu assumava entre as minhas pernas eu imaginava que a minha cona tinha um rosto como a sua em pequeno e que conversavam como dois cães d'água:
 
—Wuf wuf.
—Wuuff.
 

quarta-feira, outubro 09, 2024

gisèle prassinos

 
Viens sur moi sans tes genoux vides
Essaie sans tes doigts que je baise
D'ouvrir ce petit lit lourd de blancheur
J'y ai mis de la braise
Un souffle chaud de ceux qu'on trouve à la campagne
L'occupe et nous le fait aimer
Le matin y plonge sans cesse
Avec des fleurs et du papier d'argent
On sent sous la toile une odeur de bois coupé
Qui monte dans la tête de ceux qui le regardent
Ecoute-moi ne t'amuse pas à me lancer loin de toi
Admire un peu un objet
Que j'ai confectionné avec une peau et mon corps engourdi
 
 

 
 
Vem para cima de mim sem os teus joelhos vazios
Experimenta sem os teus dedos que eu foda
Abrindo esta pequena cama de brancura
Meti-lhe brasas
Um sopro quente desses que se encontram no campo
ocupa a cama e faz-nos amá-lo
De manhã mergulha nela incessantemente
Com flores e papel de prata
Sentimos sob a tela, um cheiro a madeira cortada
Que sobe na cabeça de quem o olha
Escuta-me não te divirtas em me atirar para longe de ti
Admira um pouco um objeto
Que confecionei com uma pele e o meu corpo entorpecido